sábado, 30 de maio de 2015

NUNCA CONFIE NUM HIPERATIVO (RIR AINDA É O MELHOR REMÉDIO)

Maurício é um aluno hiperativo, que estuda Inglês comigo no cursinho. Tem seis anos de idade e uma carinha de sacana que, às vezes, da vontade de acariciar e, às vezes... . Bem, não vamos entrar em detalhes. Maurício é daqueles pestinhas que não para nunca. Pega o lápis do colega, põe no lixo. Quando o colega vai buscar, pega o estojo dele e põe na pasta de outro colega. Nunca ouve o que eu digo; mas, mesmo assim, aprende tudo. Não sei como, mas aprende.
            Outro dia, no entanto, percebi que ele estava calado. Parecia pensativo. Olhar fixo no caderno. Eu diria que ele parecia triste. Como não dá muito para confiar nele, fiquei quieto e deixei rolar. Lembrei-me de um provérbio que a minha mãe usava muito: “enquanto o pau vai e vem as costas folgam.” Não preciso entrar em detalhes,  acho que vocês me entendem. Fui atendendo outras crianças e rezando para que aquilo durasse pelo menos uns quinze minutos.
            Não durou. De repente, ele levantou a cabeça e disse, sem rodeios: Celso, tu não qué sê meu pai? Mil coisas passaram pela minha cabeça em poucos segundos: nem morto, pensei em dizer. Nem teu vizinho eu queria ser. E outras coisas que não me atrevo a dizer aqui. Mas, é claro, que não disse nada disso. Ele mesmo se encarregou de explicar: não entendo por que meu pai deixou da minha mãe e se foi embora....
Eu também não, pensei. Só para vocês terem uma ideia, a mãe dele é uma moça de mais ou menos 25 anos. Tem olhos de um verde de selva, os cabelos são de um sol intenso, o andar é de felina e o sorriso é um mar aberto de possibilidades. Tem em torno de um metro e setenta de altura. É daquelas raras mulheres que, por mais que se procure, não conseguimos encontrar nenhum tecido adiposo excedente ao longo de seu 1.70. E olha que a galera procura! kkkk. Mas, voltemos ao Maurício.
Ser pai dele no primeiro momento havia me parecido um absurdo. Mas, como vocês já viram, o pacote que o meu pequeno interlocutor me oferecia, implícito naquela negociação, era mais que razoável. Arrisquei: por que tu queres que eu seja teu pai? 
Ele me olhou com aquele olhar inocente e ao mesmo tempo demoníaco e disse:  É que eu fico toda tarde trancado no meu apartamento, sozinho.  E aí, se tu fosse meu pai, tu podia me ajudar a fazer os temas da escooooola, do inglêeeeees. Ele espichava as vogais, acho que era para eu sentir pena dele.  .... e depois, quando a minha mãe chegasse do colégio, à noitinha ( ela é professora), tu ia embora pra tua casa.
Danadinho, pensei. Nem saiu das fraldas e já quer trapacear nos negócios. Refleti um pouco e disse para mim mesmo: não vou perder para esse projeto de malandro. Não é possível que um piá de seis anos me passe a perna, não vou deixar barato.  Ah é, que gracinha! Tu queres que eu seja teu pai só para te ajudar a fazer os temas de casa e não ficar sozinho.  Acho que tu só queres me usar.
Maurício ficou calado. Continuava pensativo. Eu continuei atendendo as outras crianças. E já tinha dado o assunto por encerrado, quando, de repente, ele se levantou, foi até onde eu estava, puxou minha camisa e, com aquela carinha deslavada e olhar de peixe morto que Deus lhe deu, falou: É que eu durmo com a minha mãe...!
E a gente pensa que eles são alienados. Imagina!